Dayana:
Maratona táxi – ônibus – barco de sempre para chegar à Guaraqueçaba (e somem aí uma kombi para nossa casa).
Não lembro se já falamos sobre isso, mas enfim, acho que é um dado importante: Guaraqueçaba fica no extremo norte do litoral do Paraná. O caminho tido como “mais fácil” para chegar à cidade inclui quase duas horas de ônibus de Curitiba à Paranaguá e mais duas horas de barco de Paranaguá até Guaraqueçaba. Dá para ir de ônibus também [desde que não chova muito – mas os caiçaras locais em geral desaconselham]: são entre 5 e 6h horas de viagem em uma estrada em péssimas condições. O barco é mais rápido mesmo, desde que se pegue ele às 09:00 – o das 13:00 são três horas de viagem. Em volta da cidade fica a maior reserva de Mata Atlântica existente hoje em dia (tal reserva não fica no Rio de Janeiro, já me perguntaram isso umas duas vezes...). É uma APA (área de preservação ambiental). Acho que essa relação homem e natureza por vezes nada harmônica está relativamente contextualizada no projeto [dá uma olhadinha lá se tiver interessado]. Voltando à viagem: ela é um pouco cansativa. A paisagem é linda, mas depois de algumas idas e vindas, ao menos para mim, ela fica um tanto quanto monótona [mas é linda mesmo, vá!]. Acho que o melhor é torcer para o barco estar vazio para dar uma cochiladinha em um banco provavelmente não muito confortável ou, como sempre acabo fazendo, apelar para um canto no chão que esteja com uma sombrinha qualquer (o Leco encarou um chãozinho comigo desta vez).
Uma coisa importante da viagem é o que o Leco chama de rádio Guaraqueçaba. Graças a uma senhora conversando em alto e bom tom com outra sobre a comunidade local, soubemos de alguns acontecimentos relevantes de Guaraqueçaba dos últimos dias: fulano brigou com não sei quem e alguns rapazes, entre eles uma molecada do ponto, sairam para pescar de noite e voltaram era mais de 4h da manhã. Salve a “fofoca”, ela é fundamental para a circulação de informações e a sociabilidade em geral.
Chegamos, a mala de rodinhas com a minha papelada quebrou e só nos restou a opção de pedir para o moço da kombi (que leva geralmente turistas para as pousadas) nos deixar em casa. Ainda bem, eu não estava mesmo afim de fazer um bom trajeto a pé sob um sol pra lá de ardido.
E foi na kombi que rolou, entre Leco e o Jaime (o motorista), a conversa mais interessante do dia. Não se trata de nenhuma novidade uma vez que sabemos que cidades pequenas costumam ter uma grande evasão de jovens, mas o fato de não ser novidade não transforma o assunto em algo irrelevante. Conversando sobre a nova estratégia da pousada (ou uma das) para qual o Jaime trabalha de abrir somente no fim de semana ou caso façam reservas (porque senão o prejuízo é muito grande nesse período do ano) apareceram as seguintes frases de Leco com as quais Jaime concordou prontamente:
Leco – Conversando com a moçada do ponto [o mais novo deve ter 10 anos e a média dos demais deve ser entre 17 e 22], ninguém tem planos de ficar por aqui. A galera quer ir para outro lugar por causa de trabalho, de estudo.
Motorista – É verdade, não tem trabalho.
Leco – O comércio é familiar, o turismo ainda é pouco. Eu vejo em Guaraqueçaba muita criança e adolescente, até uns 18 anos e depois mais velhos. Não tem muita gente no tal do “período produtivo”.
Motorista – Os mais velhos não vão embora porque acham que não vão se acostumar em outro lugar.
E a conversa acaba da seguinte forma:
Motorista – Daqui a pouco começam os tucanos lá na pousada. Esses tempos parei para contar 40/50 comendo fruta de bambu. Vai lá tirar foto. Uns 15/20 dias e eles começam a aparecer. As frutas já estão amadurecendo.
Achei bem interessante essa passagem do drama social à beleza natural. Pode ter uma boa deixa de reflexão aí... Vou colocá-la em banho maria, enrolar em jornal para dar uma amadurecida...
Mais tarde, indo almoçar, passamos por uma casa com uma placa com os seguintes dizeres: “Vende-se casa ou troca-se por imóvel em Curitiba ou no litoral.” Comentei: “Nossa, que amplo, faz-se quase qualquer tipo de negócio. A pessoa quer mesmo ir embora.” Leco comentou: “É que não tem trabalho”. Questionei, concordei no sentido que a pesca deve ser limitada e nem sempre pode-se fazer uma rocinha por causa da APA... Leco colocou: “E não é só isso. Na pesca eles não vêem uma forma de progredir financeiramente, de crescer neste sentido. Eles também querem outras coisas, celulares, roupas bonitas...” “Outros conhecimentos...”, acrescentei. “É o capitalismo”, Leco concluiu.
Fiquei pensando e conclui que a análise até que era interessante. Nós pesquisadores temos mania de pensar na viabiliade de subsistência das comunidades que pesquisamos. E quem disse que elas querem apenas subsistir? Ainda mais aqui em Guaraqueçaba, próxima de Paranaguá, uma cidade com uma infraestrutura de comunicação (internet, tv, e coisa e tal), onde os valores “da grande cidade” aparecem e que talvez não tenha meios/recursos de sustentá-los... [Isso é simplista, eu sei, mas é apenas uma apontamento.] E mais, como o fandango e as demais formas de expressão caiçara terão continuidade se a população da comunidade, frente a perspectiva apresentada, tende a se esvair? Não que essas coisas todas sejam “verdades absolutas”. São “verdades possíveis”.
Depois do almoço fomos para o Ponto, chegando lá vi o novo cronograma de trabalho que o Leco fez e como, só para variar, eu passei mal, passei o resto do meu dia em casa atrás de algumas baratas (tem muitas por aqui) e dormindo ao som da música sertaneja e outras coisitas pops do vizinho. Guaraqueçaba também tem aparelhagem! E eu sei quase todas as músicas...
Não lembro se já falamos sobre isso, mas enfim, acho que é um dado importante: Guaraqueçaba fica no extremo norte do litoral do Paraná. O caminho tido como “mais fácil” para chegar à cidade inclui quase duas horas de ônibus de Curitiba à Paranaguá e mais duas horas de barco de Paranaguá até Guaraqueçaba. Dá para ir de ônibus também [desde que não chova muito – mas os caiçaras locais em geral desaconselham]: são entre 5 e 6h horas de viagem em uma estrada em péssimas condições. O barco é mais rápido mesmo, desde que se pegue ele às 09:00 – o das 13:00 são três horas de viagem. Em volta da cidade fica a maior reserva de Mata Atlântica existente hoje em dia (tal reserva não fica no Rio de Janeiro, já me perguntaram isso umas duas vezes...). É uma APA (área de preservação ambiental). Acho que essa relação homem e natureza por vezes nada harmônica está relativamente contextualizada no projeto [dá uma olhadinha lá se tiver interessado]. Voltando à viagem: ela é um pouco cansativa. A paisagem é linda, mas depois de algumas idas e vindas, ao menos para mim, ela fica um tanto quanto monótona [mas é linda mesmo, vá!]. Acho que o melhor é torcer para o barco estar vazio para dar uma cochiladinha em um banco provavelmente não muito confortável ou, como sempre acabo fazendo, apelar para um canto no chão que esteja com uma sombrinha qualquer (o Leco encarou um chãozinho comigo desta vez).
Uma coisa importante da viagem é o que o Leco chama de rádio Guaraqueçaba. Graças a uma senhora conversando em alto e bom tom com outra sobre a comunidade local, soubemos de alguns acontecimentos relevantes de Guaraqueçaba dos últimos dias: fulano brigou com não sei quem e alguns rapazes, entre eles uma molecada do ponto, sairam para pescar de noite e voltaram era mais de 4h da manhã. Salve a “fofoca”, ela é fundamental para a circulação de informações e a sociabilidade em geral.
Chegamos, a mala de rodinhas com a minha papelada quebrou e só nos restou a opção de pedir para o moço da kombi (que leva geralmente turistas para as pousadas) nos deixar em casa. Ainda bem, eu não estava mesmo afim de fazer um bom trajeto a pé sob um sol pra lá de ardido.
E foi na kombi que rolou, entre Leco e o Jaime (o motorista), a conversa mais interessante do dia. Não se trata de nenhuma novidade uma vez que sabemos que cidades pequenas costumam ter uma grande evasão de jovens, mas o fato de não ser novidade não transforma o assunto em algo irrelevante. Conversando sobre a nova estratégia da pousada (ou uma das) para qual o Jaime trabalha de abrir somente no fim de semana ou caso façam reservas (porque senão o prejuízo é muito grande nesse período do ano) apareceram as seguintes frases de Leco com as quais Jaime concordou prontamente:
Leco – Conversando com a moçada do ponto [o mais novo deve ter 10 anos e a média dos demais deve ser entre 17 e 22], ninguém tem planos de ficar por aqui. A galera quer ir para outro lugar por causa de trabalho, de estudo.
Motorista – É verdade, não tem trabalho.
Leco – O comércio é familiar, o turismo ainda é pouco. Eu vejo em Guaraqueçaba muita criança e adolescente, até uns 18 anos e depois mais velhos. Não tem muita gente no tal do “período produtivo”.
Motorista – Os mais velhos não vão embora porque acham que não vão se acostumar em outro lugar.
E a conversa acaba da seguinte forma:
Motorista – Daqui a pouco começam os tucanos lá na pousada. Esses tempos parei para contar 40/50 comendo fruta de bambu. Vai lá tirar foto. Uns 15/20 dias e eles começam a aparecer. As frutas já estão amadurecendo.
Achei bem interessante essa passagem do drama social à beleza natural. Pode ter uma boa deixa de reflexão aí... Vou colocá-la em banho maria, enrolar em jornal para dar uma amadurecida...
Mais tarde, indo almoçar, passamos por uma casa com uma placa com os seguintes dizeres: “Vende-se casa ou troca-se por imóvel em Curitiba ou no litoral.” Comentei: “Nossa, que amplo, faz-se quase qualquer tipo de negócio. A pessoa quer mesmo ir embora.” Leco comentou: “É que não tem trabalho”. Questionei, concordei no sentido que a pesca deve ser limitada e nem sempre pode-se fazer uma rocinha por causa da APA... Leco colocou: “E não é só isso. Na pesca eles não vêem uma forma de progredir financeiramente, de crescer neste sentido. Eles também querem outras coisas, celulares, roupas bonitas...” “Outros conhecimentos...”, acrescentei. “É o capitalismo”, Leco concluiu.
Fiquei pensando e conclui que a análise até que era interessante. Nós pesquisadores temos mania de pensar na viabiliade de subsistência das comunidades que pesquisamos. E quem disse que elas querem apenas subsistir? Ainda mais aqui em Guaraqueçaba, próxima de Paranaguá, uma cidade com uma infraestrutura de comunicação (internet, tv, e coisa e tal), onde os valores “da grande cidade” aparecem e que talvez não tenha meios/recursos de sustentá-los... [Isso é simplista, eu sei, mas é apenas uma apontamento.] E mais, como o fandango e as demais formas de expressão caiçara terão continuidade se a população da comunidade, frente a perspectiva apresentada, tende a se esvair? Não que essas coisas todas sejam “verdades absolutas”. São “verdades possíveis”.
Depois do almoço fomos para o Ponto, chegando lá vi o novo cronograma de trabalho que o Leco fez e como, só para variar, eu passei mal, passei o resto do meu dia em casa atrás de algumas baratas (tem muitas por aqui) e dormindo ao som da música sertaneja e outras coisitas pops do vizinho. Guaraqueçaba também tem aparelhagem! E eu sei quase todas as músicas...
Leco:
“Ó nóis aqui traveiz!”
De volta a Guaraqueçaba, instalados na nossa confortável casinha, alimentados, eu e Daya fomos ao Ponto de Cultura explicar o cronograma do projeto para as próximas semanas. Nessa nova fase, pretendemos visitar as comunidades do Rio Verde, Abacateiro, Superagui e Ilha das Peças a fim de documentar as manifestações da cultura caiçara regional, produzir imagens para as obras de arte, discutir as imagens produzidas, estreitar nossa relação com os moradores dessas comunidades e definir os locais de instalação das obras que serão criadas por nós na fase final do projeto. Infelizmente apenas Leandro, coordenador do Ponto, apareceu. Expliquei o cronograma a ele e levantamos às possibilidades de transportes a comunidade quilombola do Rio Verde. Leandro conversou com um professor que mora aqui em Guaraqueçaba e dá aulas no Rio Verde e ele se prontificou em colaborar com o transporte usando seu carro, outra possibilidade é o ônibus que leva os alunos do Rio Verde que estudam em Guaraqueçaba. Vamos atrás da galera que está participando do projeto para sabermos quem tem interesse de ir... amanhã, sabendo a quantidade de pessoas, decidiremos o transporte.
“Ó nóis aqui traveiz!”
De volta a Guaraqueçaba, instalados na nossa confortável casinha, alimentados, eu e Daya fomos ao Ponto de Cultura explicar o cronograma do projeto para as próximas semanas. Nessa nova fase, pretendemos visitar as comunidades do Rio Verde, Abacateiro, Superagui e Ilha das Peças a fim de documentar as manifestações da cultura caiçara regional, produzir imagens para as obras de arte, discutir as imagens produzidas, estreitar nossa relação com os moradores dessas comunidades e definir os locais de instalação das obras que serão criadas por nós na fase final do projeto. Infelizmente apenas Leandro, coordenador do Ponto, apareceu. Expliquei o cronograma a ele e levantamos às possibilidades de transportes a comunidade quilombola do Rio Verde. Leandro conversou com um professor que mora aqui em Guaraqueçaba e dá aulas no Rio Verde e ele se prontificou em colaborar com o transporte usando seu carro, outra possibilidade é o ônibus que leva os alunos do Rio Verde que estudam em Guaraqueçaba. Vamos atrás da galera que está participando do projeto para sabermos quem tem interesse de ir... amanhã, sabendo a quantidade de pessoas, decidiremos o transporte.
Postar um comentário 1 comentários:
Vocês estão de parabéns. Belíssimo trabalho!
2 de abril de 2009 às 22:13