Mapa do Circuito de Instalações do Sobre-Posição Caiçara

 
 

Leco:
Hoje retornei à Guaraqueçaba com o objetivo de finalizar oficialmente as atividades de campo do Sobre-Posição Caiçara.
De carro, eu, a foto que será instalada no Rio Verde, uma mochilinha e Deus encaramos as belíssimas estradas até Guaraqueçaba com direito a alvorada na serra da Graciosa. Obrigado Mata Atlântica!
Cheguei em Guaraqueçaba 09:45, passei pela Casa do Fandango e não encontrei ninguém. Encontro Zé Muniz pela rua, vamos buscar Leandro Diéguiz em casa, buscamos umas ferramentas na casa de um amigo e combinamos com Josias (barqueiro) de nos levar até Superagui e Abacateiro na parte da tarde. Sexta e última instalação bem amarrada no rack do carro, buscamos o Michel no costão e simbora rumo a Comunidade Quilombola do Rio Verde.
No Rio Verde, deixamos algumas doações de agasalhos (que levei de Curitiba e que Zé Muniz está arrecadando na Casa do Fandango) com Jamil e pedimos autorização a ele para fixarmos a instalação no local que havíamos combinado com alguns moradores na visita anterior.
A instalação ficou pronta ás 14h10, já estávamos meia hora atrasados para viagem de barco a Superagui e Abacateiro. Pau na mula!
Chegamos no trapiche de Guaraqueçaba 14:50 e bora para voadeira.
Em Superagui uma surpresa desagradável, a instalação foi vandalizada segundo Laurentino por um cidadão de Paranaguá que depois de muito álcool na cabeça resolveu chamar atenção com essa atitude lamentável. Fazer o que? Fico mais sentido por Seu Alcides que com razão se sente desrespeitado pelo ato e vive pedindo a Laurentino para retirar a instalação. Expliquei a Laurentino que a instalação pertence a comunidade da Barra do Superagui e se a decisão deles for retirar a instalação, nós do Sobre-Posição Caiçara, respeitaremos. Retirei do AKDOV minha exposição fotográfica que pertence a Associação dos Fandangueiros de Guaraqueçaba, intitulada "Fazedores de Fandango - Práticas e Contextos Caiçaras" pois é itinerante e ainda percorrerá durante esse ano os municípios de Paranaguá, Morretes, Cananéia e Iguape.
Obrigado Laurentino, por receber a exposição em seu bar e apoiar o Sobre-Posição se responsabilizando pelo destino da instalação. Simbora para Abacateiro!

Em Abacateiro fui recebido pela filha de seu Leonildo que me informou que todos tinham saído, uns passeando, outros trabalhando... enfim, lhe entreguei umas fotos de suas duas filhas que havia prometido, o mapa das instalações para entregar ao Mestre Leonildo e ao barco devolta a Guaraqueçaba.

No meio da correria não tive tempo nem de comer (na verdade até esqueci) e cheguei em Guaraqueçaba faminto. Fui direto para o bar do Rodrigues comer uma porção de Baiacú e tomar uma gelada merecida pois conseguimos cumprir todos os objetivos no mesmo dia. Chaleira (o famoso) e Marco apareceram por lá e me acompanharam. Mais tarde o pessoal da Casa do Fandango se reuniu para uma divertida confraternização, há três dias não deixam a fogueira feita para festa junina (em frente ao Ponto de Cultura) apagar! Vinho, cataia, mãe-cá-fia, sucos, peixe, xaxixo, salgadinhos da Zilica, garantiram a reunião por horas! Eu não aguentei muito, arrumei uma caminha no chão da Casa do Fandango e dormi. No dia seguinte acordei cedo e retornei a Curitiba, fim das atividades de campo do projeto! Snif...

 
 

Dayana:

Acordamos cedo, montamos a instalação, nos banhamos, prosemos mais um pouco, acompanhamos um pouco o mutirão para arrumar o barco de Eraldo (dar uma “afinada” nele e partimos. No meio do caminho Galileu nos avisou que não tínhamos gasolina para voltar para a Ilha das Peças e, sinceramente, a viagem não estava nada agradável com chuviscos mil. Fomos para Guaraqueçaba, mas como havíamos prometido voltar ainda naquele dia para a Ilha da Peças, paramos apenas para abastecer e comprar coisas para comer e fomos para a Ilha das Peças. Chegamos lá, instalamos com a ajuda de Renato e da família de seu Genir o trabalho no campo de futebol (cuja imagem por alguns momentos se confundiu com as nuvens do céu) e partimos novamente... E que partida: o tempo abriu no fim de tarde e vimos na baía uma quantidade de botos inacreditável... Pareciam que estavam em festa... Eram tantas dezenas que chegavam a centenas... E pássaros... Deliramos, nos divertimos... Um presente...

Instalação da Ilha das Peças

Fotos: Leco de Souza.


Instalação do Abacateiro

Fotos: Leco de Souza.




Abacateiro

Fotos: Dayana Zdebsky

 
 

Dayana:
Nossa idéia, a princípio, era levar todos que pudéssemos para armar as instalações, aproveitar para dar uma festada e quem sabe, uma fandangueada. Infelizmente não rolou: não havia tempo e nem recursos... Então, encaramos o possível...

Amanheceu com o tempo fechado, chuviscando. Fomos até a casa de Galileu e como ele ainda assim topou a empreitada voltamos para casa para pegar nossas coisas, passamos na Casa do Fandango para pegar o material das instalações e bora lá. Eita dia cheio de emoções.
Nossa primeira parada foi na Ilha das Peças. Encontramos Renato e ele pediu para voltarmos outro dia já que a família do seu Genir queria preparar alguma coisinha para comemorar a instalação com a imagem dele. Ficamos de voltar no dia seguinte.
Para ir da Ilha das Peças à Superagüi tínhamos duas opções: ir de barco "por dentro" da baía ou ir "por fora". Ir “por dentro” significava algumas horas de viagem (4?) e ir “por fora” fazer o trajeto em apenas 1/2 hora, mas enfrentar alto mar que diziam ter ondas de 3 metros. Renato fez de tudo para nos convencer a ir por dentro, mas como o negócio é - diz Leco - "confiar no barqueiro" resolvemos deixar a escolha para o (louco do) Galileu. Fomos por fora... No começo a viagem foi tranqüila, mas logo as ondas começaram a crescer. Quando as ondas estavam lá com seus 1 metro e meio, um boto passou do ladinho do barco com seu filhote. Foi lindo... E as ondas continuaram crescendo, crescendo, crescendo... 3 metros! Nunca vi ondas tão grandes. Leco estava branco, Allyson ria nervoso, Galileu ficou sério, concentradíssimo (acho que foi o único momento que o vi assim). Eu estava tranqüila, achando tudo muito divertido, até porque imaginava que, mesmo com as ondas grandes, estava tudo bem com nosso barquinho poc poc, que estava tudo sobre controle. Aos poucos as ondas começaram a quebrar cada vez mais perto do barco. Galileu foi saindo um pouco mais para o alto mar, pois víamos que mais para fora elas não estavam quebrando. Passamos por uma onda e ela quebrou quase em baixo do barco. E a próxima começou a espumar no seu ápice uns três metros antes de encontrarmos com ela.Todos vieram em minha direção, jogando seu peso na beirada do barco no sentido em que a onda via. Passamos a onda e os homens do barco fizeram uma cara de alívio indescritível. Não deu dois minutos e Galileu pediu um cigarro. Leco, que tinha passado os últimos vinte minutos da viagem quase me jogando para fora do barco a fim de se segurar (ele sequer percebeu isso), disse que quase tínhamos virado e que se não fosse o contra-peso que eles (Leco, Allyson e Galileu) fizeram o barco tinha de fato virado... “O cara surfou as ondas” – disse Alison se referindo ao Galileu. É parece que o barqueiro é louco mas é bom.
Quando chegamos ao trapiche de Superagüi, que fica próximo à entrada da Bahia, alguns nativos estavam no trapiche nos olhando com uma cara um tanto quanto incrédula. Não deu outra: nós descemos do barco sob indagações como “vocês vieram por fora? vocês estão loucos?” e afirmações como “Tinha que ser o Galileu que faz suas loucuras e ainda mete os outros junto” e “Morreram doze há uns meses bem ali...”. Nesse momento sim me assustei com o que tinha feito.
Mas, como não tínhamos tempo à perder, fomos logo agilizando a instalação do trabalho. A pessoa que figura nesta instalação é o seu Alcides, fandangueiro mais velho da ilha que hoje é um dançador. Atrás dele estão Seu Eleotério e Zé Esquinini, tocando. A instalação vai ficar ao lado do AKDOV (bar onde rola o fandango por ali) e bem próxima à casa de seu Alcides. Algumas pessoas que viram nosso movimento já chegaram para ajudar, mas não sem fazer piadinhas sobre seu Alcides: “As meninas de Curitiba vão vir dançar coma foto agora...”, “Não tinha uma homem mais bonito?”, e por aí vai. A instalação gerou de imediato um movimento no seu entorno e a preocupação de seu Alcides em relação à depredação dela... Ele até tentou nos convencer a instalá-la dentro do bar... Argumentamos que o trabalho era para a comunidade e por isso tinha que ficar do lado de fora e algumas pessoas afirmaram que ele era uma pessoa muito querida e que nada iria acontecer com o trabalho... Aí seu Alcides deu uma relaxada e posou para fotos ao lado da imagem dele.
Partimos no mesmo dia para Abacateiro, em uma viagem muito muito fria. Trememos por umas duas horas e meia até chegar ao lugarejo... Nas suas imediações sentimos ainda de dentro da água o cheiro aconchegante das madeiras queimando em fogueirinhas como as que nos aqueceriam... Desembarcamos, proseamos um pouco (com Eraldo inclusive) e fui dar uma olhada interesseira na casa de fogo da matriarca local (Creusa, se não me engano) para ver se estava para rolar alguma janta... Haviam peixes em um sexto, mas ela comentou que não estavam pensando em cozinhar nada e que não estavam com fome... Como nós estávamos, nos organizamos para preparar um macarrão com molho (que na minha opinião ficou horrível, mas todos que estavam por perto comeram e se deliciaram) e convencemos Eraldo a preparar alguns peixes (ele fez um cozido). Depois, finalmente, cama (e sem banho porque estava muito frio e era impossível encarar um banho de bica geladaço ao ar livre)!

Instalação da Barra de Superagui

Fotos: Leco de Souza.


 
 

Dayana:

Novamente o nosso cronograma "mental" atrasou. Tínhamos planejado instalar as duas "obras" do centro ontem e partir hoje rumo as "ilhas". Não rolou porque apanhamos do primeiro trabalho e porque Eraldo, que seria nosso barqueiro, viajou para o Abacateiro. Galileu nos conduzirá. Partiremos amanhã.
O segundo trabalho, da canoa, foi instalado! Ficou lindo.... A canoa ficou dourada com o pôr do sol. Galileu encarou nos ajudar a deixar a bichinha em pé. O trampo foi rápido e eficiente. Depois Galileu ainda nos deu uma forcinha para ajeitar a instalação do dia anterior. Compramos cimento para ajudar a calçar as madeiras no chão. Foi uma boa solução que será aplicada a todos os trabalhos.
Foi muito prazeroso montar o trabalho da canoa. A comunidade o recebeu super bem. As pessoas saíram de suas casas para vê-la, os transeuntes paravam e a comentavam. Até os guardas da polícia florestal aprovaram o trabalho e nos explicaram que todas as canoas "desse tipo" são feitas com madeira ilegal e que eles as destróem quando as encontram no meio da mata.
Eu e Leco tivemos uma discussão hoje sobre a instalação da praça que culminou com a retirada das madeiras horizontais da estrura das instalções. A idéia foi "atenuar" o limite entre a paisagem impressa em nosso trabalho e as paisagens dos lugares onde eles foram instalados criados pelas madeiras horizontais. E é incrível, fez toda a diferença. Eu que tinha ficado absolutamente frustrada com tal "limite" a ponto de não gostar dos trabalhos, relaxei.

Fotos: Leco de Souza.


 
 

Dayana:

- Pela manhã levamos as madeiras no Wile (tá certo?), um dos marceneiros da cidade, para fazer os vincos necessários para as instalações. Achamos que seria algo "rápido", mas saímos de lá três horas da tarde. E dá-lhe pensar e discutir o suporte. Wile sugeriu que colocássemos duas ripas transversais além das madeiras verticais... Como o cara é marceneiro acatamos a sugestão do mestre.
- Pela manhã também nos reunimos com o prefeito a fim de finalmente lhe apresentar o projeto e pedir licença para colocar as instalações alí pelo centro. Tudo liberado.
- Fomos montar a primeira instalação acessorados por Leandro e Guto (além do Allyson). Apanhamos um monte, fizemos buracos à toa, montamos a instalação de pé e depois nos ligamos que seria muito mais fácil montá-la deitada... Ficou meio "capenga", mas ficou de pé. A primeira é semrpe assim... Valeu galera!
Peçam para o Leco o resultado....

Fotos: Leco de Souza.


 
 

Dayana:

Bora acordar cedo, colocar todos os suportes de madeira sobre o carro (e as placas "pet g" com as imagens). Amarra, protege, amarra, amarra... E anda um pouco, pára, dá um geitinho para tudo não cair de cima do carro e anda mais um pouco e idem. Chegamos a Paraguá duas horas depois do planejado. O pior é que deixamos Zé Muniz plantado na rodoviária nos esperando... (Desculpa Zé! Te amamos e nunca mais faremos isso!). Tivemos a idéia brilhante de mandar tudo por barco. Carregamos tudo até o barco e bora encarar a estrada que vai até Rio Verde e de Rio Verde para Guaraqueçaba. Haja buraco e lama. Chegamos em Rio Verde, e fomos direto para a casa do Professor Antônio.

A princípio apresentamos ao professor a idéia de fazer a instalação de Rio Verde com a imagem de sua sogra, Dona Santina, fandangueira da região e uma das especialistas em amargoso* que faleceu recentemente. No entanto seus filhos ainda "muito doloridos do acontecido" não nos autorizam a utilizar sua imagem, o que respeitamos imensamente e com todo carinho. Explicitamos ao Seu Antônio os motivos de nossa escolha primeira pela Dona Santina (trabalhar com a imagem de alguém que representasse bem as manifestações da cultura lcoal, querido, respeitado pela cominidade, etc...) e, a partir destes, ele nos sugeriu que visitássemos Seu João e Dona Miquilina, uma vez que seu João tocava viola ea Dona Miquila, além de ir dançar nos fandangos locais, aprendeu a fazer o amorgoso (inclusive tinha feito naquela Páscoa). Seguimos seu conselho mas, antes de tomarmos nosso rumo em direção a casa do casal, experimentamos o tal do amargoso. É bem amargo mesmo... (a tal ponto que acabei de lembrar/sentir seu gostinho...)

Eita terrinha com lama, banana e porvinha! Vixi. Mas tinha tanta porvinha por alí que uma das primeiras coisas que Dona Miquilina fez, mesmo após eu ter sentado em meio a nuvem de fumaça de sua casa de fogo, foi me dar uma calça amarela. Sim, a "porta" aqui (mesmo devendo já ter no mínimo uma graduação no assunto porvinha após um mês de campo em Guaraqueçaba varrendo diariamente um punhado de porvinhas mortos de nossa casa), mediante o calor, trocou a calça jeans e os coturnos com os quais saiu de casa por uma sainha e havaianas... E dá-lhe papear com o casal querido de tudo... Até os pintinhos que passeavam pela casa de fogo vinham catar os porvinhas de nossas canelas... Zé Muniz até comprou um litrinho de amargoso. Papeamos, fizemos fotos e tocamos o barco para visitar outras pessoas.
Rumo ao "mercadinho" do Jamil paramos em uma casa (de Cleonice e Genésio) em que a Olésia (outra fandangueira da região) estava torrando café... Papeamos um pouco, depois fomos até o Jamil, papeamos mais um pouco e voltamos em direção "ao café". Nesse meio tempo achamos que o ideal seria usar na instalação uma foto em que figurassem todos os senhores fandangueiros locais... Mas como fazer tal foto? Não é que, de repente, Zé Muniz fala: "Estão todos alí". Todos proseando no gramado ao lado da casa de Genésio e Cleonice. Fizemos a foto e partimos rumo à Guaraqueçaba.

OBS: Créditos ao Leandro Diéguiz que agenciou a galera para tirar as estruturas das instalações do barco e levá-las para a Casa de Fandango. Valeu Leandro!

* "O Amargo [ou amargoso], é uma infusão, colocando-se na cachaça, Alho, Arruda, Guiné, Betarú, chifre de Veado, espora de Arraia e alguns mais, somando 21 ingredientes, plantas, raspas e raízes, estas tiradas no mato, antes do sol nascer e de frente para onde aconteça o alvorecer. Este Amargoso, é o único que aqueles tradicionalistas levam à boca no dia de hoje, pois como seguem a religião Católica e esta pede silêncio e jejum neste dia, lembrando os sofrimentos e a morte de Jesus – alimentam assim esta tradição." Zé Muniz em http://www.informativo-nossopixirum.blogspot.com/.

Fotos: Leco de Souza.